A lua depois do gravador

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Local: Rio de Janeiro, RJ, Brazil

terça-feira, novembro 29, 2005

Telemensagem

O telefone tocou e você saiu no meio do banho, a voz dizia que era uma mensagem da sua mãe pelo seu aniversário, você achou engraçado, sua mãe jamais faria isso, mas e daí, você também não faria tanta coisa e fez, você foi se meter onde não era chamada, pedindo para que ela visse o seu sofrimento. Você que ainda não tinha visto nada, não tinha visto ninguém dizer que você não gostava de ficar com seus pais porque eles brigavam, não tinha visto seu pai levar as roupas penduradas em um cabo de vassoura, não tinha visto as lágrimas de sua mãe caírem no prato de comida, não tinha visto a dor de amar alguém. Você ficou esperando a voz, entrou uma musiquinha cafona e uma gravação onde ela te agradecia e pedia desculpas, ela te pedia perdão em vez de você pedir a ela, você entendeu pois também é mãe, era a sua vez de pedir perdão por ter sido ignorante, mas a inversão de papéis é normal entre mãe e filha, hoje você sabe, hoje você entende e acredita.

domingo, novembro 20, 2005

Lula e Lala

Você não as viu crescer, perdeu os ritos de passagem, embora não possa dizer que perdeu o melhor da festa, você viu troca de dentes, palavras ditas saborosamente erradas, viu uma delas aprender a andar de bicicleta e a outra se borrar de batom, mas não sabe porque tudo muda assim, tem saudades, fica se perguntando por que, levando as lembranças a reboque, o que fazia parte do seu cotidiano agora é peça distante da sua vida, você imagina como seria agora, duas mocinhas brincando de roda na pista de dança, você tem vontade de festejar.

sexta-feira, novembro 18, 2005

Alone again

Foi bom enquanto durou mas você não está mais apaixonada, não tem mais aquele brilho nos olhos, não sente mais que o mundo vai acabar agora ou que está dando bandeira com o jeito delicado, o olhar comprido, os gestos expansivos. Você desistiu de vez mas foi bom enquanto podia se sentir mais leve mais nova e mais feliz. Você consegue olhar de novo pra você e não pro outro, pôde descobrir que as unhas cresceram tanto em tão pouco tempo, ou que o céu nem é tão azul, ou que o sol brilha bonito na primavera carioca. Mas você preferia um céu plúmbeo, indiferente, imperfeito, mítico.

quarta-feira, novembro 09, 2005

Palco

Você era uma adolescente que adorava música, adorava músico, e o seu namorado era o irmão da sua chance, você achava que ia chegar lá, ia ser cantora, ia conhecer o meio musical. Então naquele show você foi naquele seu estilo pop, você estava de jeans e camiseta vermelha e tênis e cabelo solto, o cabelão que ninguém ainda usava e era o horror pra sua mãe, e depois do show você foi com ele ao camarim. Então ele parou o tempo pra dizer, que morena linda, ele disse bem alto, todo mundo se virou pra você, você ficou com vergonha, você era tímida mas até que gostou, afinal, o homem que cantou te cantou, você não queria nada, só queria o mundo.

quarta-feira, novembro 02, 2005

Vida rústica

Barata já é demais, não conta. Mas pensando bem, você está bem mais saudável hoje do que quando pensava ser bicho-grilo, quando era doidona e freqüentava lumiar. Você hoje dorme em uma pousada com ventilador e pintura rústica e é capaz de ler tranqüilamente debaixo da lagartixa. Foi ele quem te deixou assim, com ele você anda três quilômetros nas rochas, sobe as dunas pra ver o pôr-do-sol e anda descalça o dia todo, afinal aqui é jeri, eis a natureza de verdade, sem frescuras, o momento de se despir de tudo. Você não pode reclamar, tem o homem aos seus pés, o homem que te ama, te deseja, te admira e te completa e, de mais a mais, é seu marido. Quantas adorariam o que parece impossível, mas você ainda assim sonha, devaneia, imagina, sai de seu microcosmo e cai na vida. Mas é assim que está no livro, é assim, querendo muito e sempre que você vive.